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O som do silêncio

  • Fernanda Barreto
  • Oct 16, 2023
  • 3 min read

Eu não consegui escrever o texto da última semana – na dinâmica acordada comigo mesma de que meu ritmo seria assim. Havia muito barulho do lado de fora e dentro de mim. E eu precisava de um pouco mais de silêncio.


Do lado de fora, barulho de bomba, de choro, de destruição, de guerra. Como é que faz para desligar, para mudar o disco, se você não está alienado com o quê se passa no planeta? Aquela dinâmica tóxica de algo que você sabe que te faz sofrer e mesmo assim você não consegue desligar. Da TV, para o celular, e aí entra o computador, seja ao vivo, gravado, muda para entrevista, podcast, em looping a mesma dor. Além de digerir a crueldade das notícias, ganhamos um desafio extra que é o de tentar entender o que se passa dentro de quem, no meio disso tudo, ainda instiga um discurso de ódio. Sinto-me ainda mais enfraquecida com a tentativa de parte da sociedade que quer nos colocar como oponentes, que quer armar o povo também nas palavras. Aqueles que acham que ganham ao insultar o “adversário”, quando na verdade estão se igualando a ele. Quantas chances são perdidas de simplesmente ficar-se calado.


Que falta fazem alguns segundos de silêncio dentro de uma simples conversa, não é mesmo? Na internet, isso ainda é mais complexo porque falamos para o vazio ou, quando ainda estamos mais cegos, para uma plateia pronta para ser convertida. E a gente quer ter teoria para tudo. Quer ter opinião sobre tudo. E, pior: escuta pensando no que vai responder e não no que o outro está falando. Que falta fazem alguns segundos de silêncio.


E a nossa mente, hein? Eu não sei a de vocês, mas a minha não fica em silêncio. Por isso, eu sempre tive a convicção de que meditação seria muito bom para alguém como eu, extremamente mental e que nunca desliga – e não sou canal de televisão não! Eu tentei algumas vezes, na maioria delas falhei, mas também faltou insistência da minha parte, tenho que admitir. De uns tempos para cá, resolvi tentar pedir ajuda para minha respiração. Prestar atenção nela, observar o movimento, contar, imaginar o ar percorrendo o meu corpo. É assim quando estou em um avião. Foi assim na primeira noite após o teste positivo para Covid, no auge da pandemia, quando acordava no meio da madrugada com medo de morrer a qualquer momento e não ter ninguém para me ajudar. Respirar para não pirar. E tentar buscar o silêncio da mente.


Falando nele, o silêncio é das principais coisas que sinto falta depois de ter me tornado mãe. OK que vão dizer que depois eu vou sentir falta do barulho das crianças, mas podemos admitir que há uma fase em que o silêncio nos faz uma tremenda falta? Parece que não tem pausa. Falta um momento de corte, já diriam os editores de imagem com quem cruzei pelo caminho até aqui. É uma sinfonia de chamados, choros, gritos, onomatopeias durante as brincadeiras, ou a música chiclete da abertura do desenho favorito do seu filho. Misturado com o delicioso som de uma gargalhada de criança. Nessa montanha-russa agitadíssima que chamamos de maternidade, amor e ódio pelos sons e pelos silêncios talvez defina um pouco essa relação.


Celebro a arte de ouvir para escutar e não para responder. A espera pela melhor hora de falar. Uma pausa que se faz necessária para a gente tentar se conectar com a gente mesmo, prestar nosso respeito ao outro e talvez conseguir desacelerar. Permitir-se ouvir o som do nada. Admirar o som do silêncio.

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Quem eu sou

Meu nome é Fernanda e sou jornalista, aquariana, carioca e mãe de dois filhos. Adoro conversar, trocar ideias e viajar. Acima de tudo, busco cada vez mais sentir-me inteira. É por isso que criei o Blog Carta Aberta, um espaço para compartilhar minhas reflexões, histórias e experiências. Acredito que a escrita tem o poder de nos conectar, nos curar e transformar. Espero que você encontre aqui um lugar para se inspirar, refletir e se sentir acompanhado em sua jornada. Seja bem-vindo!

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