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Eu quero um colo

  • Fernanda Barreto
  • Sep 25, 2023
  • 3 min read

É difícil substituir o aconchego de um colo. Aquela redoma invisível que se forma no seu entorno capaz de trazer uma sensação imediata de proteção. Um conforto que te preenche e você sente, mesmo que esteja tudo desmoronando do lado de fora, um vento soprando no ouvido que diz “vai ficar tudo bem”. Quando a gente tem filho, a distribuição de colos é no esquema open bar. Faz lembrar da época em que éramos bebês e o colo era o nosso lugar de direito. Então por que será que pedir colo quando a gente vira adulto é tão difícil?


Eu não sei se vocês sentem isso aí também, mas é como se algo que é tão natural ficasse cercado de muitas cerimônias na chegada à vida adulta. Depois da tempestuosa fase da adolescência, quando parece que a única coisa que nos interessa é a liberdade, a vida – aquela eterna construção de início e fim de ciclos – nos apresenta novas necessidades. E, para mim, ganhar colo é uma delas.


No meu caso, não sei se tem a ver com o fato dos meus pais estarem mais fora de órbita e, assim, já que eu não posso mais ter, o desejo parece muito maior. É aquela sensação um tanto utópica de que tudo ficaria melhor com um afago. E aqui não estou falando apenas do ato de sentar-se no colo de alguém. Pode ser um abraço mais longo ou uma palavra de carinho que você percebe que veio lá de dentro.


Mas eu não estou falando apenas de pai e mãe. Estou falando do mundo. Dos amigos, dos parceiros e parceiras, de quem está à nossa volta e a gente sente que tem um laço de verdade. Com a vida que nos consome numa velocidade cada vez mais assustadora, mergulhamos diariamente no turbilhão particular de pendências e problemas e tirar de leve a cabeça para fora da água para respirar já parece ser grande coisa. Normalmente a gente se deixa levar pela pressão dos pratinhos que estão querendo cair e acreditamos, tolinhos, que vamos conseguir segurar todos rodando. E no fundo a gente sabe que alguns deles vão cair. Assim é a vida real. E nessa vida real sobra pouco tempo para conversas sinceras e abraços mais demorados. Será que você já se perguntou hoje quem é que cuida de você?


A tecnologia pode ser uma das vilãs dessa história. Ela nos dá a falsa impressão de que estamos próximos. Ok, ok, não vou ser a louca que ataca os feitos de Zuckerberg, Gates e Jobs porque sei que eles revolucionam as relações e permitem, por exemplo, que pessoas que estão distantes fisicamente possam fazer parte da vida cotidiana da outra. Mas tem o outro lado da moeda. Pensa comigo: você vive conversando animadamente nos grupos de WhatsApp, trocando figurinhas, áudios estilo podcast para cá e para lá. Quando nos sentamos na mesa do bar ou na sala de jantar de casa, depois de um dia cheio de trabalho, não vem um pouco aquela sensação de que já falamos tudo que tinha para falar? O quanto conseguimos mergulhar um pouco mais fundo nas conversas e colocar para fora nossos sentimentos, medos, anseios e preocupações? Nessa hora, a gente consegue dizer “ei, tô precisada de um colo”?


Outra barreira é quando a gente pressupõe que o outro sabe que você está precisando de uma atenção especial. Para nós, pode parecer muito claro. Parece que está na cara. Para o outro, provavelmente nem tanto. A gente põe a expectativa de que haja uma leitura da situação, que aquele amigo ou marido “vai sacar”. Só que temos que lembrar que não nascemos com bola de cristal. E a expectativa depositada no outro normalmente vai causar frustração e decepção. Então bora aprender a dizer as coisas com todas as letras? Não estou dizendo que está fácil não, estou trabalhando nesse mantra também.


Esse texto é para dizer que, se você está precisado ou precisada de um colo, peça. Não deixe sob a responsabilidade do acaso cuidar disso para você. Não espere que o outro perceba isso e te ofereça uma mão. Minha proposta é a gente se permitir mais pedir essa mão, esse abraço ou esse colo. E que possamos aproveitar a intensidade daquele breve momento para seguir em frente um pouco mais fortes.

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1 comentario


renatinhabahiense
29 sept 2023

Abraçar é uma das coisas que eu mais amo fazer na vida, em todos esses sentidos. Abraços físicos, virtuais, emocionais, abraçar e ser abraçada! Uma coisa que reparo que às vezes "atrapalha", é as pessoas terem a sensibilidade que o abraço requer, me explico: nem sempre é preciso procurar uma solução para a pessoa, um abraço pode ser só acolhimento, sem resolução das questões.

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Quem eu sou

Meu nome é Fernanda e sou jornalista, aquariana, carioca e mãe de dois filhos. Adoro conversar, trocar ideias e viajar. Acima de tudo, busco cada vez mais sentir-me inteira. É por isso que criei o Blog Carta Aberta, um espaço para compartilhar minhas reflexões, histórias e experiências. Acredito que a escrita tem o poder de nos conectar, nos curar e transformar. Espero que você encontre aqui um lugar para se inspirar, refletir e se sentir acompanhado em sua jornada. Seja bem-vindo!

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